sexta-feira, 11 de outubro de 2013

A poesia alheia que eu roubei dos muros

A cidade está ali sempre frenética. Os sons que ela cultiva não são dos mais belos, como os produzidos pelos grandes alemães. Mas ainda assim bonitos, ao seu jeito. Nesse movimento a cidade compõe a sua música diária e há os apaixonados por esse som desconexo e com notas musicais um pouco tortas.
Mas eu não quero falar do som da cidade, eu quero falar do silêncio. Das composições que não fazem barulho, que em muitos momentos passam despercebidas pelos citadinos. O que está escrito nos muros da cidade? É essa poesia aí que eu quero roubar. O motivo é justo, poder contar um pouco sobre as ruas que eu vejo e as doces frases que leio e algo sobre as pessoas.
Vi certo dia, perdida, já quase apagada: “Eu quero gritar na próxima esquina”. E naquele dia gritar na próxima esquina me seria bem satisfatório. Iria desatar o nó que estava na garganta e o peso das atividades que me consomem diariamente. Vamos gritar? É o que estão nos pedindo. Vamos!
E a janela do ônibus que eu costumo pegar para ir ao trabalho continua a me revelar outras celebres estruturas poéticas. “Vive e luta. Essa luta é para valer”. Que valor? O do preço, como nas mercadorias que compramos, ou para valer a plenitude de uma vida? Pela revolta das letras e a forma como estavam dispostas eu imagino que seja por dias melhores mesmo. Olha só, a cidade cobrando por seus dias mais doces, para que ela não sofra tanto e que suas mazelas um dia possam se apagar como a tinta com que se escreveu a rebeldia dita mais acima.
Ora está certo “Teresina é linda, não é cinza”. A cidade não quer mais ser cinzenta ela quer a poesia. E o verso urbano é no sentido de conviver com os desafios da posteridade sem perder de vista o passado. Há também poesia nos prédios velhos, nos cantos das casas, nas esquinas onde alguns já se divertiram ensandecidamente e esse tom realmente não é cinza. Lindo é com certeza.
E se a poesia dos muros ainda assim não for suficiente a gente pode deixar os recados dependurados com pregos nas portas. Um deles dizia assim: “Correspondência, entregar na janela”. O senhor carteiro vai lembrar certamente das histórias de amor dos livros de Shakespeare. A doce literatura de receber cartas pelas janelas. É certo que muitas delas serão contas. Mas nada é tão perfeito, como um amontoado de palavras escrita por alguém romântico, ou o gênio inglês.
Vendo assim, eu noto como eu me enganei ao dizer que os versos dos muros eram silenciosos. Eles são mais barulhentos que as buzinas em horário de trânsito intenso. A diferença é que esse som vivaz pode tocar apenas o coração de alguns mais atentos que resolvem olhar pela janela enquanto cruzam um via qualquer, em um canto qualquer. E aí, vamos rabiscar o muro alheio? Pode ser um "Atalho para a liberdade". 

Foto: Kelson Fontenele

2 comentários:

Germano disse...

Parabéns! Gostei dem do texto!!!

Nonato Véras disse...

Demais, vivo isso também. Meus olhos quase furam os muros. Valeu POETA!!!!!